Os anticoncepcionais afetam o desejo sexual?
Understanding how birth control methods affect libido and what you can do about it.
*Tradução: Sarah Luisa Santos
Uma crença comum sobre contraceptivos hormonais é que eles diminuem o desejo sexual da pessoa ao diminuir o seu nível de testosterona, ou porque faz com que o corpo pense que tem uma gravidez.
Seu médico/a ou assistência médica pode informar que os anticoncepcionais hormonais não afetam o seu desejo sexual.
Porque afirmar isso é complicado
Essa é uma pergunta difícil de responder. Estudar sexo, libido (desejo sexual), e prazer sexual é complicado. Nosso desejo sexual e prazer sexual são impactados por nossa fisiologia, psicologia, expectativas sociais, e as interações entre estas áreas. Além disso, nós ainda não temos uma grande compreensão da anatomia sexual feminina ou do orgasmo feminino.
Existe muita pesquisa investigando sexo e contracepção, e nem todas estão de acordo entre si. (Como espécie nós fomos à lua, mas ainda não conseguimos concordar sobre a existência do ponto G). Aqui está o que você deve saber.
Ao usar uma opção de contracepção hormonal ou um dispositivo intrauterino (DIU), a experiência sexual da pessoa pode ser impactada positivamente ou negativamente por:
sua fisiologia básica, como seus níveis de hormônios circulatórios e sua sensibilidade às mudanças desses níveis
o tipo e os níveis dos hormônios no seu contraceptivo hormonal
como a forma do contraceptivo impacta na produção de hormônios do corpo (isso impede a ovulação?)
suas expectativas em relação ao sexo e ao prazer
parceiros(as) e suas relações e as opiniões dele(a) sobre o contraceptivo
que tipo de sexo se prefere e se gosta
como se sente em relação aos efeitos positivos do contraceptivo
a severidade e o nível de importância que se colocm nos efeitos negativos do contraceptivo
como se sente em relação aos riscos de fazer sexo sem um contraceptivo (ex. gravidez indesejada, infecções sexualmente transmissíveis) (1,2).
Então, existem jeitos específicos com as quais cada uma das categorias acima influenciam o sexo. Pesquisadores(as) e profissionais de saúde dividem as queixas sexuais em quatro categorias principais:
Desejo (ou libido) que se refere ao interesse por sexo
Excitação, no que se refere às mudanças físicas, como a lubrificação, e mudanças emocionais que as pessoas têm quando pensam ou fazem sexo
Orgasmo/satisfação
Dor física (3-6)
Ao decidir sobre o uso de contraceptivos hormonais, é importante você pensar sobre os fatores que são mais ou menos importantes em uma boa experiência sexual para você.
Se alguma forma de método contraceptivo hormonal diminuísse o seu desejo sexual, mas melhorasse o seu orgasmo, você acharia que este método teria um impacto positivo, negativo ou neutro na sua vida sexual?
Se o seu contraceptivo faz com que você tenha uma menstruação irregular e seios doloridos, mas protege quase 100% de uma gravidez indesejada, os benefícios seriam maiores do que os pontos negativos para você?
Nós não iremos analisar todos efeitos colaterais de cada forma de contracepção hormonal aqui, mas eis aqui algumas coisas que você deve prestar atenção ao ler a pesquisa a seguir.
E, mesmo que de acordo com a pesquisa um método “no geral” não tenha impacto na vida sexual das pessoas, algumas ainda podem vivenciar melhoras ou pioras em suas vidas sexuais. A experiência da média não é a experiência de todos.
Usar um app como o Clue para controlar o seu uso do método anticoncepcional e seus sintomas pode ajudar na hora de comunicar suas necessidades para a sua assistência médica.
Aqui está o que a pesquisa diz sobre cada método de contracepção hormonal
Contraceptivos hormonais combinados e sexo
Contraceptivos hormonais combinados (CHC) é uma categoria de contraceptivo que inclui a pílula com hormônios combinados (ex. contraceptivos orais ou a pílula), o anel vaginal, e o adesivo hormonal. Esses tipos de contraceptivos contêm uma forma de estrogênio e de progestina (uma progesterona sintética). O CHC funciona ao impedir a ovulação e engrossar o muco cervical (7).
A pílula anticoncepcional (várias marcas)
Estudos sobre o efeito da pílula combinada no funcionamento sexual não estão de acordo entre si. A maioria dos estudos não achou nenhum impacto ou melhora da função sexual em quem usa a pílula (1,2).
Em 2013, em uma revisão dos estudos publicados desde os anos 70 sobre a pílula e a função sexual, pesquisadores descobriram que mais de 6 pessoas em 10 não tiveram mudanças na libido ao usar a pílula, e mais de 2 pessoas em 10 tiveram um aumento na libido, e cerca de 1 pessoa em 10 teve uma diminuição na libido (2).
Formulações diferentes (mascaramentos químicos) e regimes (número de dias que a pessoa toma a pílula hormonal comparado aos dias sem pílula ou pílula placebo) podem impactar o funcionamento sexual (1,2). Regimes de pílula que têm mais dias com pílulas contendo hormônio, acima que o usual 21 dias com hormônios / 7 dias com pílulas placebo podem ter maior probabilidade de melhorar as funções sexuais (1,2). Baixas quantidades de estrogênio podem causar mais mudanças na libido sexual que altas quantidades (isso é chamado relação de resposta à dose).
Em um estudo de 2013, todas as pessoas usando a pílula com a menor dose de estrogênio disponível (15 microgramas), relataram ter uma diminuição na libido, enquanto pessoas usando pílulas com doses mais altas de estrogênio, a maioria relatou nenhuma mudança ou aumento na libido (2). O número de pessoas usando a pílula de baixa dose era pequeno – apenas 140 pessoas – então é difícil dizer se estes resultados podem ser generalizados para qualquer pessoa.
Alguns estudos analisaram mais do que apenas a libido.
Um controle de teste aleatório em 2016 examinou como as pessoas usando uma formulação de pílula se diferenciavam sexualmente de pessoas usando o placebo (ex. pílula que não contém nenhuma droga) em sete áreas da função sexual (8). Eles descobriram que as pessoas no grupo da pílula eram mais propensas a relatar diminuição na libido, desejo e excitação (8).
No entanto, diminuição na excitação ou desejo sexual não parece significar menos sexo, ou menos sexo bom. Ambos os grupos relataram praticamente o mesmo número de “episódios sexuais satisfatórios” e mesmas pontuações para questões sobre orgasmo (8).
Uma forma que CHCs podem impactar negativamente o seu desejo sexual é através da diminuição dos níveis de testosterona no corpo (1,2,8,9). Baixa testosterona é conhecida por diminuir o desejo sexual, mas a relação entre testosterona e desejo sexual não é muito bem compreendida (1,2,9). Pessoas com um nível alto anormal de testosterona, como as pessoas com síndrome dos ovários policísticos (SOP), não necessariamente têm uma libido maior (2,10); no entanto, pessoas com libidos consistentemente baixas por vezes se beneficiam ao tomar suplementos de testosterona (2,9,11).
Em um teste aleatório em 2016, pesquisadores descobriram que as pessoas que usam a pílula tiveram níveis de testosterona mais baixos do que elas tinham no começo do estudo, e níveis mais baixos que os grupos placebo no acompanhamento (8).
Apesar dessa diferença, níveis de testosterona não eram associados com nenhuma diferença na função sexual (8), sugerindo que baixos níveis de testosterona podem não ser a causa para a diferença relatada.
O anel e o adesivo
O anel vaginal hormonal e o adesivo hormonal são menos estudados do que a pílula.
Um estudo de revisão descobriu que pessoas que usam o anel tinham três vezes mais propensão de relatar umidificação vaginal e menor probabilidade de relatar, comparadas às pessoas usando a pílula. Ambas, tanto que usam a pílula quanto o anel relataram melhora na função sexual, incluindo maiores pontuações em prazer sexual e orgasmo, comparadas com pessoas usando métodos não-hormonais (12).
Em um teste de controle aleatório onde pessoas foram consignadas a tomar a pílula combinada ou o anel, ambas relataram maior função sexual de 3 a 6 meses (13).
Um benefício potente que a pílula combinada, o anel, e o adesivo têm em comum é que eles podem ser usados para pular a menstruação (14). É seguro não menstruar enquanto se usa o método contraceptivo, portanto uma pessoa que não gosta de fazer sexo no seu período menstrual pode usar esses métodos para aumentar o número de dias de sua atividade sexual. (Embora seja perfeitamente seguro e normal fazer sexo durante o seu período menstrual).
Alguns tipos de CHCs com uso estendido (por exemplo, embalagens que têm 24 dias de pílulas hormonais), e o de uso contínuo (por exemplo, embalagens que pessoas usam pílulas hormonais por alguns meses) podem também reduzir a frequência das enxaquecas menstruais e os sintomas negativos antes da menstruação (14), o que pode melhorar o humor da pessoa e no todo, sua vida sexual.
Contraceptivos de progestina e sexo
A pílula (ex. “mini pílula”)
Pílulas com apenas progestina são pílulas que não contém estrogênio. Elas funcionam primariamente engrossando o muco cervical (15).
Poucos estudos analisaram a função sexual entre usuários de pílulas com apenas progestina.
Em um estudo onde participantes usaram a pílula combinada, pílulas com apenas progestina, e o anel vaginal por 3 meses cada, pessoas relataram um interesse sexual maior durante os 3 meses que usaram o anel vaginal comparado a qualquer uma das pílulas (16). Pesquisadores também descobriram que estes tipos de contraceptivos afetam os níveis de testosterona dos participantes. Essa relação foi modificada pela genética, especificamente pela sensibilidade ao receptor andrógeno, ou as proteínas nas células que leem os andróginos, em cada participante (16) (testosterona é um tipo de andrógeno)
Em um estudo que incluiu participantes da Escócia e das Filipinas, a pílula com apenas progestina em quatro meses não teve impacto no interesse ou atividade sexual em comparação ao placebo (17). De forma interessante, a pílula combinada teve um impacto negativo no sexo para participantes da Escócia, mas não para os participantes das Filipinas (17), sugerindo que a fisiologia e/ou experiências socioculturais podem impactar na aceitação do método contraceptivo.
A injeção (ex. Depo-Provera)
O contraceptivo injetável com apenas progestina ou “injeção”, às vezes também conhecido pelos nomes da marca Depo-Provera/DMPA e Noristerat, é uma forma de contracepção que apenas contém progestina. É dado como uma injeção a cada 8 ou 12 semanas, dependendo do tipo. Estes métodos funcionam ao impedir a ovulação e engrossar o muco cervical (15).
Não existe muita pesquisa sobre o impacto de contraceptivos injetáveis na libido.
Um estudo nos Estados Unidos descobriu que após 6 meses de uso, pessoas usando DMPA relataram 2 a 3 vezes mais que estavam com “falta de interesse em sexo” comparadas com as pessoas usando DIU de cobre, que não contém hormônios (18).
Em um estudo conduzido no Quênia, cerca de 1 em 10 pessoas usando DMPA relataram “libido reduzida” durante 6 meses de uso (19) e 2 de 15 pessoas que pararam de usar DMPA relataram libido reduzida (19).
Mas, DMPA não tem necessariamente um efeito negativo em todo mundo.
No estudo do Quênia, não existiu uma mudança na média do interesse sexual ou excitação, e a média das pontuações para “aproveitamento” e “orgasmo” aumentaram (19). (deveria ser notado, que, não está claro se essas pontuações incluíram as pontuações de pessoas que descontinuaram o estudo antes de 6 meses. Excluir essas pessoas melhoraria as pontuações.)
Outro estudo entre adolescentes com idades de 14-17 não achou diferenças em relatos de interesse sexual entre os usuários de DMPA, usuários de pílula combinada, e pessoas que não usaram métodos contraceptivos (20). Um estudo entre adultos chegou a conclusões semelhantes (21).
Um beneficio da injeção que pode melhorar a vida sexual de uma pessoa é que não requer tomar a pílula todos os dias ou usar a camisinha para prevenir uma gravidez – a pessoa tem apenas que se preocupar sobre o contraceptivo a cada 8 ou 12 semanas. A injeção também pode reduzir o sangramento menstrual e enxaquecas (14), o que pode aumentar o número de dias que ela queira fazer sexo.
Implante (ex. Nexplanon)
O implante contraceptivo (ex. Implanon, Nexplanon) é um dispositivo que contém apenas progestina. É colocado no alto do braço. O implante funciona suprimindo a ovulação e engrossando o muco cervical (22). Dura até 3 anos, mas pode ser removido antes dos 4 anos se desejado.
Menos de 1 em 20 pessoas usando o implante relataram diminuição na libido, embora estimativas variem (23-27).
Em um estudo, usuários do implante tendem a relatar mais que tiveram falta de interesse em sexo comparados aos usuários do DIU de cobre (18). Apesar disso, poucas pessoas descontinuaram o uso do implante por causa da libido perdida (23-28).
Um estudo relatou melhora geral no funcionamento sexual e melhora na satisfação sexual de 3 a 6 meses de uso do implante (28). Isso sugere que o implante possa impactar negativamente a vida sexual de um número pequeno de usuários, mas para maioria ele não melhora ou piora a vida sexual.
O implante pode melhorar a vida sexual de uma pessoa ao reduzir o estresse de se preocupar com a gravidez indesejada. O implante é o método mais eficiente de contraceptivo (29), com apenas 1 em 2000 usuários que tiveram gravidez indesejada durante 1 ano de uso. O implante também pode reduzir dores menstruais (14).
DIU hormonal e de cobre
Existem dois tipos de DIU: hormonal e o de cobre. O DIU hormonal (ex. Mirena, Kylena e Lilleta) libera progestina, que engrossa o muco cervical e às vezes impede a ovulação (22). O de cobre interfere com a funcionalidade do esperma (22).
Ambos dispositivos são colocados no útero e podem durar entre 3 e 10 anos, dependendo de sua especificidade. Um DIU pode ser removido a qualquer momento se a pessoa não quer usá-lo mais.
No geral, usuários de DIU hormonal e de cobre relatam que seu método contraceptivo não tem impacto ou melhora na sua satisfação sexual (30-33).
Um estudo descobriu que 9 de 10 pessoas usando qualquer tipo de DIU não tiveram mudanças na libido e 3 em 10 relataram um aumento na espontaneidade sexual (30).
O DIU hormonal também foi associado com maior desejo sexual, diminuição de dores sexuais, e baixos níveis de disfunção sexual, comparado com a função antes do uso do DIU, ou comparado com pessoas sem uso de contraceptivo (31,31).
Como o implante e a injeção, o DIU é uma ótima escolha para pessoas que não querem pensar em um método contraceptivo todos os dias. O DIU também por si só é uma das formas mais efetivas de anticoncepcional. Apenas 1 em 500 pessoas usando o DIU hormonal ficaram grávidas em 1 ano de uso. Para o DIU de cobre, 4 em 500 ficaram grávidas em 1 ano de uso (29). Embora quem use o DIU hormonal possa vivenciar no começo sangramentos anormais ou prolongados, ele tende a diminuir o sangramento menstrual e a dor menstrual depois de alguns meses de uso (14), o que pode melhorar a experiência sexual de uma pessoa.
O que fazer se você acha que o seu método contraceptivo está afetando sua vida sexual
Escolher um método contraceptivo não é um compromisso para a vida. Mesmo se você decidir usar o implante ou DIU, você sempre pode removê-los antes da data de validade acabar.
Se você está feliz com o seu método e ainda tem alterações na vida sexual, você pode considerar outras coisas acontecendo na sua vida, como estresse ou como é sua relação com alguém, que podem estar causando alterações na sua vida sexual. Se você está começando um novo método, considere esperar alguns meses para ver como o seu corpo se ajusta ao novo contraceptivo. No entanto, a decisão é 100% sua de quando parar de usar algum método. Você não precisa esperar para mudar de métodos se você não quiser.
Se você está usando contraceptivo ou não, você pode usar o Clue para acompanhar a sua frequência sexual e libido. Saber disso pode ajudar a tomar decisões mais bem informadas sobre começar, parar ou mudar de método contraceptivo.