Como era menstruar na Grécia Antiga?
Uma entrevista com a historiadora Helen King
Tradução: Sarah Luisa Santos
Os primeiros tampões eram feitos de madeira? A menstruação mudou ao longo da história? De onde surgiu a frase “on the rag” (em tradução livre “no pano”)?
Se você já pensou sobre alguma dessas questões, Helen King provavelmente já as estudou. King é uma historiadora que está se especializando em História da Medicina e recentemente se aposentou como professora de Estudos Clássicos. Ela escreveu sua dissertação de doutorado sobre a menstruação na Grécia Antiga, é autora de diversos livros, e tem um blog chamado “Mistaking Histories” (em tradução livre “errando histórias”). Eu pedi para ela dividir com a gente algumas coisas que ela sabe.
A menstruação era diferente, historicamente, se comparada ao que é hoje?
É certamente possível que as mulheres tivessem menos menstruações e sangramentos mais leves, só pelo fato de suas dietas não serem tão boas quanto as de agora. Mas, estranhamente, a expectativa era de que elas sangrassem bastante e regularmente, e se isso não acontecesse, então alguns remédios precisavam ser usados para “tirar o sangue”.
Isso remete a uma crença achada nos textos Hipocráticos do século 5 ou 4 AEC, em que a carne da mulher era mais esponjosa do que a do homem, portanto absorvia mais fluídos do que era ingerido, e esses fluídos se acumulavam o mês inteiro. Se eles não saíssem, as mulheres ficavam doentes, já que o sangue poderia apodrecer ou ir para outras partes do corpo e pressionar órgãos vitais.
Aristóteles menciona a menstruação como sendo igual ao fluxo de sangue de um animal sacrificado. Hoje em dia isso soa bem estranho – não parece legal ser comparada a um animal sacrificado – mas nós poderíamos fazer uma análise positiva e dizer, como o sacrifício era muito importante para manter a comunicação entre os deuses e seres humanos, então, não é maravilhoso que nossos corpos pudessem fazer isso?
Como as pessoas lidavam com o sangue menstrual?
Em relação a diversas épocas, nós simplesmente não sabemos. Talvez, se as famílias pudessem bancar, as mulheres simplesmente não saíam de casa, mas essa era uma opção não existente para quase todas as mulheres. Sara Read analisou isso no começo da Idade Moderna Europeia e concluiu que a grande maioria sangrava nas suas próprias roupas. Nos períodos históricos que vieram depois, nós sabemos que panos eram colocados entre as pernas (lembre-se da frase “on the rag” - "no pano"), e eram lavados e secados para serem reutilizados.
Teve uma sugestão bem estranha do grande historiador alemão Theodore Mommsen do século 19, em que a palavra rhakoi – “rags” (panos) – na lista de roupas das mulheres dedicada à deusa Ártemis em Atenas Antiga, significava “panos de menstruação”. Ele ficou bem desconcertado com essa possibilidade, e não menos importante também era onde esses panos eram guardados depois do uso!
A maioria das pessoas, entretanto, pensa que essa palavra é apenas um comentário sobre a condição das roupas previamente usadas – e se tornou “ragged” (esfarrapado). Em textos médicos medievais, na parte “Tratamentos para mulheres”, o que Monica Green chamou de a “Trotula conjunta” dos textos medievais sobre o corpo feminino, mulheres com “fluxos sanguíneos ao mesmo tempo que as menstruações” eram instruídas a se sentarem em uma rúcula cozida em vinho, com um pano feito de linho colocado entre a rúcula e elas. Essa não é uma prática normal, é um tratamento, mas talvez indique que esse pano de linho era também parte da prática normal no período menstrual. Eu falo mais sobre isso no meu blog (em inglês).
Você acha que seria prático usar alguns desses “produtos” para a menstruação nos dias de hoje?
Sim, definitivamente. Absorventes reutilizáveis são uma ótima ideia, mas eles demandam uma atitude diferente em relação ao sangue menstrual. Ver isso como uma forma de “desperdício” e que precisa ser escondido e jogado fora “higienicamente” é contra a ideia de lavar seus absorventes e secá-los! Outro problema é que depende do quão intensa é a sua menstruação. Eu não estou convencida de que absorventes reutilizáveis são a resposta para uma menstruação com fluxo sanguíneo intenso, especialmente se você precisa viajar.
O que nós precisamos prestar a atenção ao examinar informações históricas sobre menstruação?
Nós precisamos lembrar que as fontes do assunto são homens, e as mulheres devem ter tido o seu próprio jeito de lidar com isso. Até mesmo mulheres escritoras, como Jane Sharp no século 17, estavam lidando com um modelo de corpo que deriva dos escritores gregos e romanos e isso não estava aberto a nenhuma mudança.
Quais são os mitos mais comuns sobre a menstruação em períodos históricos? Você pode nos dar alguns fatos?
O maior mito é o do “tampão antigo”, em que os gregos enrolavam algodão em uma pedaço de madeira e inseriam isso. Ai! Eu escrevi sobre isso em meu blog (em inglês). Não existe evidência disso no Mundo Antigo, e isso parece ter sido originado –imaginem – em um site que vende tampões.
Outro mito que pode competir neste pódio é a teoria da menotoxina – (a ideia de que as mulheres emitem) uma substância tóxica quando menstruam. Isso explicaria todos aqueles costumes ao redor do mundo nos quais as mulheres não fazem geleia quando estão menstruadas porque não iria dar certo, ou que não deveriam fazer pão porque ele não iria crescer, não deveriam estocar carne porque iria apodrecer... Ou não deveriam fazer permanente no cabelo porque não iria funcionar! Como a última sugestão implica, isso tem uma longa história!
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